De agricultor a presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região no Piauí. Para alcançar tal objetivo, o cearense Francisco Meton Marques de Lima, teve que administrar bem o tempo para conciliar o trabalho na lavoura com os estudos. Das noções básicas que pegou durante o Ensino Fundamental, ele chegou à Universidade Federal do Ceará, onde cursou Direito e 17 anos após a graduação chegaria a ser um dos maiores juristas do Brasil.
De origem humilde, Meton Marques conta que encontrou dificuldades para estudar, mas através da persistência conseguiu chegar ao curso que tanto queria e hoje é autor de vários livros na área jurídica. Em entrevista ao G1, o magistrado fala sobre sua vida e como conseguiu vender 50 mil exemplares do livro sendo um dos poucos autores nesta área a receber direito autorais.
G1: É verdade que o senhor estudou só até o 4º ano (antiga 3ª série) e somente aos 18 anos retornou a uma sala de aula? O que aconteceu nessa época?
Desembargador: Nasci em Campanário, município de Uruoca no estado do Ceará. Por morar na Zona Rural, recebi apenas algumas noções básicas de alfabetização porque tinha que trabalhar na roça e em uma bodega (comércio pequeno). Estudei até a 3ª série e ao completar a maioridade, aparece-me a primeira oportunidade: Um carroceiro convida-me a seguir viagem com destino a Coreaú e lá ingressei no Grupo Escolar Vilebaldo Aguiar, onde fiz todo o curso primário em apenas um ano. Já em 1974, estudei no Ginásio Municipal Nossa Senhora da Piedade e fiz preparatório para as provas do curso supletivo. Quem fosse aprovado teria o curso ginasial completo e ingressaria no segundo grau. Da numerosa turma de Coreaú, apenas três obtiveram êxito e eu estava entre eles.
G1- Como conseguiu entrar em uma Universidade Federal mesmo tendO estudado pouco durante o ensino fundamental? Como foi sua preparação para o vestibular?
Desembargador: Eu iniciei o segundo grau em 1975 ainda em Coreaú. Fiz escola normal onde era o único homem da turma. No ano seguinte, mudei para a Casa do Estudante Secundarista do Ceará (CESC), em Fortaleza. Lá me matriculei no Colégio Estadual João Hipólito onde fiz o segundo ano do segundo grau. Como na época, o ensino publico direcionava ao curso técnico, optei por contabilidade. Depois fui cursar o 3º ano no Colégio Esquema, instituição de ensino particular que preparava turmas com mais de 80 alunos para o concurso vestibular da Universidade Federal do Ceará (UFCE). Como no ginásio e ensino médio, eu estudei pouco geografia, português, química e física e tive que estudar em dobro estas disciplinas.
G1: Cursar Ciências Jurídicas foi vocação?
Desembargador: Tinha em mente fazer engenharias Civil, Elétrica, Mecânica e de Pesca. Mas na hora da inscrição mudei de ideia ao ver Direito como primeira opção da lista. Em janeiro de 1978 saiu o resultado da UFCE e para minha surpresa fui aprovado em 3º lugar para o curso de Direito. Das 60 questões da área de humanas, acertei 56. Durante o curso morei na Residência dos Estudantes Universitários (REU) e por três anos e meio, fui assistente judiciário em 12 repartições públicas como voluntário (remunerado apenas pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca – DNOCS). Trabalhei como revisor do Jornal Tribuna do Ceará, por fim, estagiei no Banco do Estado do Ceará (BEC). Em julho de 1981, recebi o diploma de bacharel em Ciências Jurídicas. Logo em setembro, estava com a carteira de registro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
G1: Como foi a preparação para o concurso de juiz?
Desembargador: Em outubro de 1978 fiz a inscrição para o concurso para Juiz Substituto do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (Ceará). Já em novembro do mesmo ano me inscrevi para o mestrado em direito na UFCE. Estudava nos intervalos e quando saia do Banco do Ceará, me dedicava ao concurso e ao mestrado. Em junho de 1982 sai o resultado do concurso e sou aprovado em primeiro lugar. Cinco anos depois inicio na docência da UFCE.
G1: O projeto de criação do Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região é de sua autoria. Como surgiu a ideia?
Desembargador: Eu vim ao Piauí para substituir algum colega do TRT que saísse de férias. Naquela época, todo caso de Direito Trabalhista no Piauí ficava sob a responsabilidade de duas varas apenas, as quais estavam subordinadas ao TRT do Ceará, primeiramente, e ao TRT do Maranhão, em um segundo momento. As condições de trabalho na época eram precárias. Alguns colegas pediam que eu me transferisse para cá a fim de coordenar trabalhos de elaboração de um projeto de criação de um Tribunal Regional do Trabalho. Aceitei o desafio e em 1989 fiz o requerimento com pedido de transferência. Elaborei o projeto que foi enviado pela OAB ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). A votação foi apertada, mas culminou na aprovação do projeto de lei. Este foi enviado pelo TST ao Congresso nacional pelo qual passou sem maiores problemas, em 1991. Logo em 1992 deu-se a instalação do Tribunal Regional do Trabalho da 22ª região.
G1: Quando veio para o Piauí você conseguiu sua transferência para a Universidade Federal. Fez mestrado e depois doutorado na Universidade Federal de Minas Gerais. Foi nesta época que escreveu seu primeiro livro?
Desembargador: Não. Meu primeiro livro foi baseado em minha tese de mestrado. Ainda em 1992 publiquei “ Interpretação e Aplicação do Direito do Trabalho”. Em 1997 fiz dourado em Direito constitucional e destes estudos publiquei o “O Resgate dos Valores na Interpretação Constitucional” em 2001 pela editora Abc Fortaleza. Em 2003 publiquei “Manual Sintético de Direito do Trabalho” e “Manual Sintético de Processo e Execução do Trabalho”. O “Elementos de Direito do Trabalho e Processo Trabalhista” é uma simplificação da doutrina para uma melhor assimilação do conteúdo de direito do trabalho e processo trabalhista para concurso de juiz do trabalho.
G1- Acordãos do TRT da 22ª região são citados em decisões do STF. O que isso representa para o senhor?
Desembargador: O jurisdicionário piauiense pode ser visto como referência em todo o país. Em apenas 20 anos de existência, os acórdãos do TRT da 22ª região são citados com freqüência pelas sentenças prolatas por todo o país, inclusive pelo próprio Supremo Tribunal Federal.
G1- Mesmo tendo ajudado na criação do TRT da 22ª região o senhor só chegou à presidência somente após seis anos. Qual era o critério de escolha para o cargo?
Desembargador: Os presidentes são escolhidos por idade e na época da criação eu era o mais novo do Tribunal por isso só assumi a presidência em 1998 e retornei agora em 2013 para mais uma gestão.
G1- O que mudou na justiça do trabalho no Piauí após a chegada do TRT?
Desembargador: Nós tivemos muitas conquistas durante estes 20 anos. Alguns trabalhadores tiveram os direito adquiridos e conseguimos tirar muitas crianças das ruas e dos lixões. Quando cheguei ao estado via muitos garotos trabalhando em semáforos e nos lixões, hoje a realidade deles é outra.
Fonte: G1
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